As disputas eleitorais de ontem e de hoje
Gilberto Sant´Anna
No período imediatamente depois à proclamação da República aconteceu a deflagração da Primeira Grande Guerra, quando o Brasil declarou neutralidade, isto é não participou oficialmente do conflito, “(...) uma vez que o país possuía importantes transações comerciais – e dívidas - com os dois lados conflitantes (...)” Revista de História da Biblioteca Nacional, nº 101, fevereiro de 2014, pag. 64.
Nem por isso a paz grassou entre os homens, mulheres e crianças de boa vontade. Ocorreram inúmeras escaramuças em solo pátrio, encabeçadas pelo movimento social de caráter político-militar batizado de “TENENTISMO”.
Os jovens militares eram conservadores, autoritários e adeptos do positivismo, isto é, típicos revolucionários antimonarquistas do período denominado “ República das Oligarquias Cafeeiras”. Combatiam o “coronelismo”. Lutavam por reformas políticas e sociais, pela moralidade política, pela prisão dos corruptos, pelo fim do voto de cabresto, pela reforma do sistema educacional público e pelo voto secreto nas eleições. Durante a Revolução Paulista tenentista de 1924 as famílias paulistanas refugiaram-se nos sítios ao redor da capital, inclusive em Atibaia, onde as notícias chegavam quentes como brasas. A região bragantina acompanhou as tropas de Isidoro Dias Lopes. Destacamos os heróis Alberto Stramiéri, de Canedos, e Alexandre Zanoni, de Jarinu.
Claro, o quadro desabonador influenciou a vida política nacional. As façanhas atribuídas aos “coronéis” são vastas e caricatas. As artimanhas tornaram-se impagáveis. A legislação eleitoral, editada da pelos compadres, permitia todo tipo de fraude. Por exemplo, o eleitor carregava no bolso a cédula a ser depositada na urna.
Os candidatos treinavam os correligionários, na maioria residentes na zona rural, para dar eficácia ao exercício do voto. Montavam cabines e urnas simuladas. A prática minimizava os medos e supria o pouco manejo com os hábitos citadinos. No dia aprazado os votantes eram transportados para local próximo das secções instaladas pela Justiça. O material de votação, adrede preparado, restava escondido nos bolsos internos da roupa. As mulheres utilizavam as bolsas e o sutiã. Durante o percurso até a urna, “boqueiros” diversos trocavam os papéis trazidos às mãos. Na hora de sufragar sacava-se a cédula entranhada. Dentro da cabine de pano preto, envelopava-se o “voto secreto”, sob o olhar vitorioso do cabo eleitoral acompanhante.
Cumprido o dever cívico o votante e familiares faziam jus à “gororoba” ou “boia”, ou seja, à alimentação à base de arroz, feijão, macarrão, ensopado de carne com batata, farinha e refrigerante, tudo servido à vontade nos comitês partidários. Os candidatos também ali comiam em solidariedade e agradecimento. Depois os eleitores eram devolvidos aos sítios, geralmente arranjados em cima de um caminhão de carga.
O farmacêutico e vereador Bento Marcondes Escobar exibia logo à entrada da farmácia, na rua José Alvim, um quadro dos “18 do Forte”, certamente orgulhoso das propostas e desabafos tenentistas. Talvez, por não cabalar votos ou usar de expedientes espertos, sempre exerceu mandato eletivo na condição de suplente.
Bento Escobar, como era conhecido, pertenceu ao Partido Democrático, ao lado de Álvaro Correia Lima, major Sebastião Teodoro Pinto, Sílvio Russomano e José Herculano Bueno e tantos outros. Eram da oposição aos Alvins.
É possível compararmos eleitoralmente esse período republicano com o atual? As questões nas primeiras décadas do século XXI muito se assemelham com as do engatinhar do liberalismo, há cem anos. Tudo pouco mudou. Hoje as grandes massas são igualmente manobráveis, embora eletronicamente, não obstante ainda existam os cabos eleitorais a laçar eleitores nas quebradas da miséria.
A grande mídia, de propriedade do capital hegemônico, elege os “representantes do povo”, segundo os próprios apetites. Manipulam, como faziam os “coronéis”, apesar de nem sempre o resultado das urnas respeitar os interesses da riqueza.
Nos Estados Unidos da América os poderosos apoiaram o Mitt Romney que perdeu a presidência da República para o reeleito Barack Obama. Na América Latina a burguesia jogou todas as fichas no Henrique Caprilles da Venezuela e no Aécio Neves do Brasil. Também perderam. O fato se repetiu em diversas nações abaixo do Equador.
Pesquisas foram feitas para se entender o porquê. Descobriram a pólvora sem fazer estrondo. Enquanto os candidatos impressos em dólar propunham reformas na contramão dos interesses das classes menos favorecidas (mudanças significativas na Previdência Social e nas Leis Trabalhistas, do calibre da terceirização dos serviços públicos e privados), os vencedores souberam interpretar e atender as angústias populares.
No caso do Brasil, a austeridade (arrocho) capitaneada pela alemã Ângela Merkel não foi implantada. Ao contrário, criou-se programas contra a fome e acesso à escolaridade. Deu-se uma banana para a agiotagem do FMI e outras siglas especulativas e maléficas. Eleição perdida, os magnatas agora demonstram impaciência e não desejam esperar pela próxima disputa de a 2018. Chacoalham a democracia para criar condições à campanha das INDIRETAS JÁ.
O fato não é novidade. Os regimes ditatoriais ocupam largo espaço nos livros de história. Nessa hipótese, aguarda-se para breve a instalação da barbárie política e econômica ardendo no lombo dos brasileiros. As riquezas nacionais (petróleo, água e grandes áreas férteis, minerais etc. ) cairão em poder da pirataria internacional com bandeira já fincada no asfalto da Avenida Paulista. Só a aliança Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, o BRICS, pode salvar a humanidade do caos. Publicado na edição de 18-04-15, no JC Atibaia (www.jcatibaia.com.br)